Meu filho mais velho, Gui, precisou mudar de escola no meio do ano, enquanto ainda cursava a segunda série. Eu, que detesto despedidas, sofri pelo meu pequeno. “Pegue o telefone de todo mundo. Vamos visitá-los nos fins de semana”, tentei incentivá-lo. E ele foi, mochila nas costas, pronto para mais um “até breve”.
Não seria a primeira mudança nos seus sete anos de vida. Certa vez tivemos que mudar de bairro. Ele frequentava uma escolinha desde os três anos de idade. Mas com cinco teve que deixá-la. Nos dias seguintes reclamava a saudade que sentia dos amigos. Às vezes uma lágrima insistia em pular dos olhos. Combinamos então de levá-lo numa festa junina, onde poderia rever todos os seus coleguinhas. O dia chegou e fomos até o clube onde bandeirinhas e bambus decoravam a entrada. Logo que ele entrou no salão e reviu os amigos, correu na direção deles, abraçou-os e chorou. Como chorou. Um choro de saudade engasgado no seu pequeno e frágil peito. E todos, naquela festa, choramos juntos.
Agora a cena se repete. Fui buscá-lo no seu último dia de aula na escola. Mas ao invés de encontrar um menino triste, encontrei-o feliz. Com um pacote de cartinhas de seus amigos. “Quase todo mundo na classe quis fazer um desenho para mim”, me contou.
Em casa espalhamos os papéis sobre a mesa. “Vou sentir saudades de você, Guilherme. Te amo”. “Não queria que você fosse embora”, “Vou ficar triste”, “vamos brincar de pega-pega-corrente”entre outras mensagens com desenhos coloridos de sol, casa, amigos no futebol, prédios e até um solzinho triste. “Vou guardar isso para sempre”, me disse, ao mesmo tempo me enchendo de perguntas se eu tinha saudades dos meus antigos amiguinhos. “Eu tenho, filho. Muita saudade”, respondi.
As crianças tem uma capacidade enorme de serem diretas. De falarem o que pensam e declarar o amor e a amizade. Parece ser um sentimento que não pode ser domesticado. Com o passar dos anos a gente aprende a habilidade de domesticar os sentimentos. Não confiamos para não nos decepcionarmos depois. Não amamos simplesmente porque acreditamos que o outro não mereça e passamos a selecionar com quem “brincar”. Queremos estar com os mais fortes, mais espertos, mais bem sucedidos. Nosso cérebro vira uma calculadora de emoções sempre pronta a nos mostrar as amizades mais “vantajosas”.
Por outro lado, a alma continua teimosa. Se ressente pela ausência daquele carinho infantil e desinteressado. Do pega-a-pega, do futebol e do esconde-esconde. E nessa frenética briga, às vezes escapa a criança aprisionada dentro de mim. E me dá uma vontade imensa de dizer aos meus amigos (dos cinco até os anos atuais) que os amo. De dizer a minha família que a amo muito. De beijar meus pais, filhos, esposa, tios, primos e irmãos. De escrever uma cartinha e desenhá-la com paisagens de barquinhos, sol, árvores, um cachorro, uma pipa, uma bola e muita gente. De colorir tudo e dobrar cuidadosamente. Viver pode ser bem melhor se tivermos o coração de uma criança.